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  • A Divina Comédia/Inferno/VII
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  • Virgílio, em tudo sábio: — “Da aterrada Mente” — me diz — “se desvaneça o susto! Poder Pluto não tem, que tolha a entrada”. E, se volvendo ao vulto, de ira adusto, Lhe grita: — “Cal’-te, ó lobo abominoso! Em ti consome esse furor injusto! “Se ao abismo descemos tenebroso, A lei se cumpre do alto, onde, em castigo, Suplantara Miguel bando orgulhoso”. — Como o mastro, abatendo, traz consigo Velas, que o vento de feição tendia, Baqueou-se por terra o monstro imigo. E, pois que o quarto círculo se abria, Mais penetramos pela estância horrenda, A que todo seu mal o mundo envia.
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  • Inferno — Canto VII
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notas
  • Tradução de José Pedro Xavier Pinheiro
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  • por Dante Alighieri, tradução de José Pedro Xavier Pinheiro
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  • Virgílio, em tudo sábio: — “Da aterrada Mente” — me diz — “se desvaneça o susto! Poder Pluto não tem, que tolha a entrada”. E, se volvendo ao vulto, de ira adusto, Lhe grita: — “Cal’-te, ó lobo abominoso! Em ti consome esse furor injusto! “Se ao abismo descemos tenebroso, A lei se cumpre do alto, onde, em castigo, Suplantara Miguel bando orgulhoso”. — Como o mastro, abatendo, traz consigo Velas, que o vento de feição tendia, Baqueou-se por terra o monstro imigo. E, pois que o quarto círculo se abria, Mais penetramos pela estância horrenda, A que todo seu mal o mundo envia. Ah! justiça de Deus! Que lei tremenda, Dores, penas, quais vi, tanto amontoa? Por que da culpa nos obceca a venda? Como em Caribde a vaga que ressoa Embate noutra, e quebram-se espumantes: Assim turba com turba se abalroa. Almas em cópia, nunca vista de antes, Fardos de um lado e de outro, em grita ingente, Rolavam com seus peitos ofegantes. Batiam-se encontrando rijamente, E gritavam depois, atrás voltando: “Por que tens?” “Por que empurras loucamente?” Assim no tetro círc’lo volteando Iam de toda parte ao ponto oposto, Por injúria o estribilho apregoando. Nos semicírc’lo novamente rosto Faziam, té o embate reiterarem. Eu, me sentindo à compaixão disposto, — “Quem são? Que razão há para aqui estarem?” Ao Mestre disse — “À esquerda os colocados Clérigos são para tonsura usarem?” — “Da mente sendo vesgos, transviados” — Tornou — “andaram na primeira vida, Sempre os bens aplicando desregrados. “Quem seus clamores ouve não duvida: Levantam grita aos termos dois chegados, Onde oposta os separa a culpa havida: “Os que então de cabelos despojados Clérigos, papas, cardeais hão sido, Pela nímia avareza subjugados”. — — “Entre eles” — respondi — “Mestre querido, Muitos serão, por certo, que eu conheça, Imundos desse mal aborrecido”. — — “Te enganas, quando assim — diz — “te pareça: Da sua ignóbil vida a oscuridade Vestígio não deixou, que ora apareça: “Eles se hão de embater na eternidade: Ressurgindo, uns terão as mãos fechadas, Os outros de cabelos pouquidade. “Por dar mal, por mal ter, viram cerradas Do céu as portas; penam nesta lida, Com mágoas, que não podem ser contadas. “Vês quanto é de vaidade iludida A ambição, em que os homens a porfiam, Da Fortuna anelando os bens na vida. “Todo o ouro, que as entranhas conteriam Da terra, não pudera dar repouso A um dos que em fadiga se cruciam”. — — “Quem é Mestre” — falei — “o portentoso Ser, que chamas Fortuna, que à vontade Bens distribui ao mundo cobiçoso?” — Responde o Vate: — “Ó cega humanidade, Quanta ignorância a mente vos ofende. Do meu pensar direi toda a verdade. “Quem pelo seu saber tudo transcende, Os céus criando, guias elegeu-lhes; E toda parte a toda parte esplende, “Pela luz que igualmente concedeu-lhes. Assim fez aos mundanos esplendores, Geral ministra e diretora deu-lhes, “Que em tempo os bens mudasse enganadores De nação a nação, de raça a raça Contra esforços de humanos sabedores. “A pujança de um povo é grande ou escassa Segundo o seu querer, que, se escondendo Qual serpe em erva triunfante passa. “Contra ela o saber vosso não valendo, No seu reino ela tem poder e mando, Como os outros o seu, estão regendo. “Mudanças incessante efetuando, Se apressa por fatal necessidade, E assim tantas no mundo vai formando. “Tal é Fortuna, a quem por má vontade Insulta o que louvá-la deveria, Censurando-a com dura iniqüidade. “Mas, feliz, não escuta a vozeria, E entre iguais criaturas primitivas, Volvendo a esfera, em paz goza alegria. “Desçamos ora a dores mais esquivas; Estrelas baixam, que ao partir surgiram; Demoras são defesas, são nocivas”. — Os nossos passos através seguiram Do círculo até fonte, que, fervendo, As águas brota, que torrente abriram, A cor mais negra do que persa tendo. Ao longo do seu curso nós baixamos, Por caminho diverso nos movendo. Lagoa, dita Stígia, deparamos, Junto à encosta maligna produzida Pelo triste ribeiro, que notamos. Eu, que tinha a atenção toda embebida, Vi sombras, nesse pântano, lodosas, Desnudas, de face enfurecida. Não só co’as mãos batiam-se raivosas; Peitos, cabeças, pés armas lhes sendo, Com dentes laceravam-se espantosas. — “As almas, filho meu, que ora estás vendo São dos que” — disse o mestre — “venceu ira. Como certo também fica sabendo “Que sob as águas multidão suspira, E em borbulhões as águas entumece Por toda essa extensão, que vista gira”. — — “Nos doces ares, a que o sol aquece” — No ceno imersas dizem — “tristes fomos: Dentro em nós fumo túrbido recresce. “Ora no lodo inda mais triste somos”. — Com voz cortada assim gargarejavam, De palavras somente havendo assomos. “Os passos, em grande arco, nos levavam. Do paul sobre a borda seca; o bando, Tendo à vista, que assim lodo tragavam, E junto de uma torre alfim chegando.
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