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| - Agora, que o nosso bom Juvêncio chegou ao seu destino, podemos encontrar-nos de novo com os outros dois heróis desta narrativa, - Carlos e Alfredo. No sexto dia depois da saída de Santos, estavam em frente à barra do Rio Grande. A vista da terra, onde poderiam enfim descansar, e o pensamento dos parentes que iam encontrar, restituíram-lhes a animação. Voltaram-lhes ao olhar o fulgor e ao espírito a curiosidade dos primeiros dias. A costa, baixa, parecia-lhes bem diferente daquelas por onde haviam passado desde Espírito Santo até Santa Catarina. O mar raivoso era mais terrível, e o frio mais vivo. - Boa ou má estará a barra? - era a pergunta de toda a gente. A barra estava boa: o paquete ultrapassou-a serenamente, e logo depois passava perto da pequena povoação de São José do Norte, para chegar à cidade do Rio Grande, onde esperava Carlos que os tios os viessem receber. Mas nenhum conhecido apareceu no primeiro momento, o que foi uma forte decepção. Rogério procurou distraí-los, convidou-os a seguir para Porto Alegre. - Não! Sei que meus tios não podem deixar de vir! - disse Carlos. Efetivamente, alguns minutos depois de fundeado o navio, apareceram a bordo dois homens, procurando pelos rapazes. Eram eles. Carlos reconheceu-os logo, principalmente o mais moço, pela sua extrema semelhança com aquele, cuja imagem ainda o menino guardava nos olhos e no coração. E os meninos caíram nos braços dos tios, aos soluços, soluços convulsivos, que diziam toda a saudade, todo o desespero, que traziam acumulados na alma. Mas os tios não os deixaram assim por muito tempo: - Ora! Ânimo! Para que chorar?... E isto diziam num tom tão natural, tão desprendido, que a Carlos pareceu quase impossível que assim lhe falassem parentes... O rapaz ergueu a cabeça, e olhou-os surpreendido, quase indignado. Então, maior foi o seu espanto, ao reparar que os tios não estavam cobertos de luto. - É verdade! - disse um dos tios - ainda não tomamos luto. Depois lhe direi porque! Agora vamos desembarcar. E não nos demoraremos na cidade; vamos para a estância, onde está mamãe. - Mas porque não estão de luto? - perguntou Carlos, sem se conter, assim que desembarcaram. - Porque não podemos ter a certeza da morte de seu pai! Esperávamos vocês, para saber alguma coisa mais segura. Que certeza têm da morte de seu pai? Viram-no, morto? - Não... - E então? Não se pode aceitar um fato importante, como este, sem uma prova, ou, ao menos, um fundamento razoável, um indício ponderável... Ainda, esperamos ter a certeza. Ouvindo isto os dois meninos entreolharam-se, e sentiam-se cheios de uma nova animação. Pareceu-lhes outro o mundo... era como se, na treva de uma noite espessa, tremeluzisse o primeiro raio longínquo da luz de uma estrela. Carlos perguntou, ansioso: - E agora? E como?... O tio sorriu, abraçando-o, confortando-o: - Agora? Como? Esperemos! Quando suspeitamos a existência de uma desgraça, não podemos ter a segurança da sua impossibilidade, mas também não devemos perder toda a esperança. Esperemos! E vamos seguir imediatamente para Pelotas; hoje mesmo iremos para a estância, onde mamãe nos espera ansiosa. Despediram-se do excelente Rogério, e partiram. Deste modo, nem puderam ver o Rio Grande. Tiveram tempo apenas para almoçar e partiram. Viram o cais, e duas ou três ruas principais. - Há povoações inteiras de alemães, aqui; são as antigas colônias, - explicavam-lhes os tios. É como em Santa Catarina... Ás duas horas da tarde, chegaram a Pelotas. A cidade pareceu-lhes linda, situada numa eminência alegre. Mas a ânsia de chegar era grande. Às cinco horas da tarde, estavam na “estância”, que é o nome dado no Rio Grande às fazendas de criação. A velha avó não se pôde conter: recebeu-os em pranto, lágrimas ao mesmo tempo de prazer e saudade. Beijando-os, parecia-lhe beijar o próprio filho, que vira pela última vez havia onze anos. Quanto aos rapazes, esses continuavam naquele estado incerto de sonho e dúvida em que os havia deixado as palavras dos tios... Categoria:Literatura brasileira Categoria:Literatura infantil Categoria:Olavo Bilac
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